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ESTADO DO ACRE

SECRETARIA DE ESTADO DA CASA CIVIL

Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 3.467, DE 27 DE DEZEMBRO DE 2018

 

Dispõe sobre a regulamentação das escolas e professores indígenas instituídos e mantidos pelo Poder Público.

O GOVERNADOR DO ESTADO DO ACRE

FAÇO SABER que a Assembleia Legislativa do Estado do Acre decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

 

CAPÍTULO I

Das Definições e Disposições Preliminares

 

Art. 1º O ensino público estadual Indígena é formado pelo conjunto de profissionais da educação indígena, unidades escolares indígenas e centros de formação de professores indígenas vinculados à rede de ensino público, nos territórios indígenas, que realizam atividades de educação escolar indígena sob a responsabilidade da Secretaria de Estado de Educação e Esporte do Acre - SEE. 

 

Parágrafo único. Os centros de formação de professores indígenas também poderão funcionar fora dos territórios indígenas.

 

Art. 2º Os profissionais do ensino público estadual indígena são os professores, os servidores técnico-administrativos educacionais e o apoio administrativo educacional que desempenham atividades diretas ou correlatas às atividades de ensino e aprendizagem interculturais e específicas nas unidades escolares indígenas, em centros de formação, em órgãos centrais ou intermediários do sistema estadual de ensino.

 

Art. 3º O magistério público indígena é composto pelo conjunto de profissionais indígenas da educação no cargo de professor, que exerçam a docência intercultural, específica, diferenciada e monolíngue em língua indígena ou portuguesa, bilíngue ou multilíngue, e as funções de suporte pedagógico direto à docência, à coordenação e gestão escolar e direção de escolas, no âmbito do ensino público em unidades escolares indígenas e centros de formação de professores indígenas vinculados à rede pública de ensino.

 

Art. 4º O ensino público indígena goza de autonomia e ordenamentos jurídicos próprios, de especificidades pedagógicas interculturais e diferenciadas, linguísticas, culturais, territoriais, de gestão e administração escolar e de docência na educação básica, em consonância com o sistema estadual de ensino público.

 

Art. 5º A SEE deverá assegurar no âmbito do magistério público estadual indígena o adequado atendimento às necessidades e especificidades pedagógicas, formativas, administrativas, financeiras, estruturais, de alimentação e transporte que garantam a oferta de uma educação escolar de qualidade sociocultural em todas as etapas e modalidades.

 

CAPÍTULO II

Dos Objetivos

 

Art. 6º Constituem os objetivos da educação escolar indígena no âmbito da SEE:

I - promover junto às escolas indígenas, a igualdade social, o respeito às diferenças culturais, as especificidades dos povos indígenas, o bilinguismo e o multilinguismo, a interculturalidade, a autonomia pedagógica, de gestão e financeira, o fortalecimento das escolas indígenas, a reafirmação de suas identidades étnicas e o protagonismo dos povos indígenas diante de seus projetos educacionais e societários.

II - assegurar e reconhecer a condição das unidades escolares indígenas com normas e ordenamento jurídicos interculturais e próprios aos povos e comunidades indígenas, visando a efetiva, adequada, específica e orgânica articulação da escola indígena ao sistema educacional;

III - assegurar e reconhecer aos povos indígenas, a isonomia, a equidade, as especificidades e condições especiais para o acesso, permanência e sucesso na formação profissional para a docência e gestão escolar interculturais;

IV - assegurar condições de ingresso na carreira do magistério público estadual indígena e o desenvolvimento de práticas pedagógicas e experiências de gestão educacional alicerçadas na plena valorização das culturas indígenas, em suas organizações sociais, sistemas de conhecimento, projetos educacionais e societários;

V - garantir o pleno acesso aos conhecimentos universais, orientados pela Base Nacional Comum Curricular - BNCC e pelas diferentes realidades dos povos indígenas; e

VI - Assegurar e zelar para que o direito à educação escolar indígena intercultural, diferenciada, bilíngue e multilíngue se constitua enquanto peça fundamental às comunidades indígenas, com qualidade social e pertinência pedagógica, cultural, linguística, ambiental e territorial, respeitando as lógicas, saberes e perspectivas dos próprios povos indígenas.

 

CAPÍTULO III

Dos Princípios da Educação Escolar Indígena

 

Art. 7º Constituem-se como princípios da educação escolar indígena:

I - o compromisso com a criação e aplicação de mecanismos interculturais para atingir os objetivos pedagógicos, técnico-administrativos e gerenciais das escolas indígenas e dos projetos comunitários de educação escolar de cada povo indígena;

II - a valorização das línguas, culturas, conhecimentos tradicionais, a recuperação das memórias históricas, a reafirmação das identidades étnicas dos povos indígenas no processo de escolarização em aldeias;

III - os saberes e práticas indígenas devem ser base a outros conhecimentos, valorizando os modos próprios de conhecer, investigar e sistematizar o saber de cada povo indígena;

IV - a autonomia e a identidade educacional indígena, com o desenvolvimento de metodologias e modelos diferenciados, interculturais, bilíngues e multilíngues de educação escolar;

V - o pleno exercício da cidadania, assegurando ao aluno indígena a formação intercultural de qualidade;

VI - a ampla participação comunitária na tomada de decisões para a gestão educacional, levando-se em consideração e reconhecendo as formas tradicionais de organização social e política dos povos indígenas em diálogo com o sistema de ensino público estadual;

VII - o reconhecimento do valor e da efetividade pedagógica dos processos próprios e diferenciados de ensino e aprendizagem dos povos e comunidades indígenas;

VIII - compromisso com a profissionalização do exercício do magistério público indígena;

IX - garantia de acesso, permanência e conclusão com êxito do professor indígena na formação docente;

X - a articulação dos diversos contextos formativos, tais como a comunidade, o movimento indígena, a família e a escola;

XI - a avaliação como um dos elementos que compõe os processos de ensino e aprendizagem e estratégias didáticas interculturais e específicas;

XII - a participação da sociedade civil organizada indígena e de apoio às populações indígenas na construção da política de educação escolar indígena; e

XIII - a consulta livre, prévia e informada, como mecanismo essencial para o planejamento e execução das ações educacionais, dirigida aos povos indígenas.

 

CAPÍTULO IV

Da Organização e Funcionamento da Educação Escolar Indígena

 

Seção I

Elementos Básicos

 

Art. 8º São elementos básicos para a organização, a estrutura e o funcionamento das unidades escolares indígenas:

I - a centralidade do território para o bem viver dos povos indígenas e para seus processos formativos e, portanto, a localização das escolas em terras habitadas por comunidades indígenas, sejam estas demarcadas, em processo de estudo ou tradicionalmente ocupadas, ainda que se estendam por territórios de diversos municípios contíguos;

II - a organização escolar própria;

III - atender exclusivamente a comunidade indígena; e

IV - o ensino deverá ser bilíngue, exercido prioritariamente em língua indígena e, em língua portuguesa, quando na comunidade educativa não existirem falantes da língua indígena aptos à docência.

 

Art. 9º Na organização de cada escola indígena deverá ser considerada a participação de representantes da comunidade indígena, na definição do modelo de organização e gestão, bem como:

- suas estruturas sociais;

II - suas práticas socioculturais, religiosas e econômicas;

III - os sistemas indígenas de produção de conhecimento, processos próprios e métodos de ensino-aprendizagem;

IV - O uso de materiais didático-pedagógicos produzidos de acordo com o contexto sociocultural de cada povo indígena e, preferencialmente, elaborado junto à comunidade indígena de cada aldeia ou povo.

 

Seção II

A Gestão Intercultural nas Unidades Escolares Indígenas

 

Art. 10. A gestão intercultural das unidades escolares indígenas se configura como um conjunto de processos intencionais e específicos, promovidos e dirigidos pelas comunidades indígenas e tem os seguintes objetivos:

I - criar mecanismos interculturais para atingir os objetivos pedagógicos, técnico-administrativos, financeiros e gerenciais das escolas indígenas e dos projetos comunitários de educação escolar de cada povo indígena;

II - consolidar processos autônomos, periódicos e sistemáticos para o planejamento, avaliação e acompanhamento com vistas ao atingimento de metas educacionais interculturais pertinentes a cada unidade escolar indígena;

III - assessorar as unidades escolares indígenas, na construção de processos de gestão intercultural, adequando-se a administração pública aos princípios da educação escolar indígena;

IV - garantir que as tomadas de decisões para a gestão educacional em escolas indígenas considerem as formas tradicionais de organização social e política dos povos indígenas em diálogo com a SEE;

V - garantir a estruturação das equipes gestoras das unidades escolares indígenas, respeitando-se as diretrizes para o funcionamento das escolas indígenas, reconhecendo-lhes a condição de escolas com normas e ordenamento jurídico próprios, visando à valorização plena das culturas dos povos indígenas e a afirmação e manutenção de sua diversidade étnica e educacional;

VI - garantir que a gestão das escolas indígenas seja exercida prioritariamente por membros do respectivo povo, preferencialmente, pertencentes às respectivas aldeias nas quais estão instaladas as escolas; e

VII - garantir a estruturação nas unidades escolares indígenas de conselhos escolares e comitês executivos, proporcionando condições para gestão financeira das unidades escolares indígenas.

 

CAPÍTULO V

Da Oferta da Educação Escolar Indígena

 

Art. 11. Na oferta das modalidades e etapas na escola indígena, as atividades consideradas letivas podem assumir variadas formas, como: séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos com tempos e espaços específicos, grupos não-seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização conforme as necessidades e especificidades educacionais indígenas.

 

Parágrafo único. Em todas as etapas e modalidades da educação básica, serão garantidos os princípios da igualdade social, da diferença, da especificidade, do bilinguismo, multilinguismo e da interculturalidade.

 

Art. 12. Cada povo e unidade escolar indígena poderá construir propostas educacionais específicas cabendo à SEE a avaliação e ao Conselho Estadual de Educação - CEE a regulamentação.

 

Art. 13. A SEE promoverá as condições necessárias à regularização e credenciamento junto ao CEE de todas as etapas e modalidades ofertadas nas unidades escolares indígenas:

I - as escolas indígenas de forma autônoma poderão apresentar seus projetos político pedagógicos; e

II - a SEE deverá oferecer formação e assessoramento pedagógico, gerando condições adequadas para que as unidades escolares indígenas elaborem seus projetos político pedagógicos.

 

Art. 14. O ano letivo nas unidades escolares indígenas transcorrerá de forma a respeitar a legislação vigente no âmbito da educação básica, podendo:

I - ser independente do ano civil, devendo-se constituir calendários específicos, todas as vezes que assim desejarem as escolas indígenas da rede estadual de ensino público; e

II - cada povo ou comunidade indígena ao elaborar seu calendário específico deverá encaminhá-lo para que a SEE o aprove. 

 

Art. 15. A SEE deverá oferecer condições para que se proceda com o adequado registro e emissão, em língua portuguesa e língua indígena, dos documentos escolares dos alunos matriculados nas escolas indígenas da rede estadual de ensino.

 

Art. 16. A SEE deverá implementar a gestão democrática intercultural por meio de lei específica para escolas Indígenas da rede estadual de ensino público, com vistas à composição das equipes gestoras indígenas e a plena articulação da escola indígena no sistema de ensino.

 

Parágrafo único. Até a publicação da lei de gestão democrática intercultural deverá ser garantida às unidades escolares indígenas a composição de equipes gestoras, cujas matrículas somarem no mínimo cem alunos.

 

CAPÍTULO VI

Das Etapas e das Modalidades de Ensino nas Unidades Escolares Indígenas

 

Seção I

Da Educação Infantil

 

Art. 17. A educação infantil é direito dos povos indígenas e sua oferta se realizará observando os fundamentos da educação intercultural, diferenciada, bilíngue e específica.

 

§ 1º Caberá a cada aldeia decidir sobre a implantação ou não da educação infantil, cuja oferta deverá ser precedida de consulta livre, prévia e Informada a todos os envolvidos com a educação das crianças indígenas na aldeia demandante.

 

§ 2º A oferta desta modalidade fortalecerá os laços familiares e contextos tradicionais de aprendizagem, garantindo-se:

I - a participação das famílias e dos sábios, especialistas nos conhecimentos tradicionais de cada comunidade, em todas as fases de implantação e desenvolvimento da educação infantil; 

II - a utilização das línguas indígenas nas atividades escolares; 

III - o respeito às práticas de educar e de cuidar de cada comunidade indígena como parte fundamental da educação escolar das crianças de acordo com seus espaços e tempos socioculturais; 

IV - a elaboração de materiais didáticos específicos e de apoio pedagógico para a Educação Infantil, garantindo a incorporação de aspectos socioculturais indígenas significativos e contextualizados para a comunidade indígena de pertencimento da criança; e

V - o reconhecimento das atividades socioculturais desenvolvidas nos diversos espaços institucionais de convivência e sociabilidade de cada comunidade como atividades letivas, definidas nos projetos político pedagógicos e nos calendários escolares.

 

Seção II

Do Ensino Fundamental

 

Art. 18. O ensino fundamental como direito humano, social e público subjetivo, deverá aliar-se à ação educativa da família e da comunidade, cujo eixo central fomentará o direito à diferença e à igualdade, observando-se:

 

§ 1º As culturas dos povos indígenas e sua territorialidade serão base para o acesso aos conhecimentos relacionados às ciências humanas, da natureza, matemática e linguagens, tendo a leitura, a escrita, o numeramento e a prática reflexiva como competências estruturadoras do processo de ensino e aprendizagem.

 

§ 2º A SEE garantirá aos estudantes indígenas condições favoráveis ao fortalecimento da relação com o meio ambiente, a natureza, os territórios indígenas, suas culturas e línguas, seus modos de vida, organizações sociais e costumes de suas comunidades e povos.

 

Seção III

Do Ensino Médio

 

Art. 19. O ensino médio, com duração mínima de três anos, etapa final da educação básica, fortalecerá os laços de pertencimento identitário dos estudantes com seus povos, suas comunidades de origem e seus territórios, promoverá a valorização dos patrimônios culturais, linguísticos e ambientais, consolidando o percurso intercultural de formação do aluno.

 

§ 1º Cada comunidade educativa ou povo poderá adotar a modalidade de oferta desta etapa da educação básica que melhor se adequar às suas realidades, bem como aos seus projetos educacionais e societários, respeitada a legislação pertinente à etapa, modalidade e aos fundamentos da educação intercultural e específica.

 

§ 2º Caberá a SEE atualizar as propostas e procedimentos pedagógicos e de formação para o atendimento das especificidades apresentadas pelas comunidades indígenas e seus povos, garantindo-se:

I - o protagonismo dos estudantes indígenas, o ensino não fragmentado, o desenvolvimento das capacidades de análise para a de tomada de decisões, resolução de problemas, flexibilidade para continuar o aprendizado de diversos conhecimentos necessários às interações dos alunos com sua comunidade, seu povo e com outras sociedades indígenas e não indígenas; 

II - as condições necessárias à superação de desafios contemporâneos, ao fortalecimento da relação com o meio ambiente, a natureza, os territórios indígenas, suas culturas e línguas, seus modos de vida, organizações sociais e costumes de suas comunidades e povos, aliando, em sua formação escolar, conhecimentos científicos indígenas e não indígenas, num processo educativo intercultural, dialógico e transformador; e

III - o uso de suas línguas como importante estratégia pedagógica para a valorização e promoção da diversidade sociolinguística acreana.

 

Seção IV

Educação Especial

 

Art. 20. A educação especial é uma modalidade de ensino transversal que visa assegurar aos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento, transtornos específicos da aprendizagem, com altas habilidades e superdotação, a igualdade de condições para o acesso, a permanência, a conclusão com sucesso e o desenvolvimento das suas potencialidades socioeducacionais em todas as etapas e modalidades da educação básica nas escolas indígenas, por meio do Atendimento Educacional Especializado - AEE.

 

§ 1º A SEE deverá estruturar, com o devido aporte financeiro do Ministério da Educação e Cultura - MEC, salas com recursos pedagógicos adequados de forma a garantir a plena inclusão do aluno indígena com necessidades especiais na educação básica.

§ 2º A oferta do AEE será precedida de estudos de casos e de diagnósticos prévios a serem realizados pela SEE através da coordenação de educação escolar indígena e da coordenação de educação especial.

 

§ 3º Os estudos de casos e os diagnósticos prévios deverão qualificar o tipo de atendimento e quantificar o número de alunos aos quais as escolas deverão oferecer o plano de AEE. 

 

§ 4º Ao estudante e à família será facultada a opção pela abordagem pedagógica que julgarem adequada, ouvidos os profissionais especializados em cada caso, voltada à garantia da educação de qualidade sociocultural.

 

§ 5º A SEE garantirá a acessibilidade aos estudantes indígenas com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento, transtornos específicos da aprendizagem, com altas habilidades e superdotação, por meio de prédios escolares, equipamentos, mobiliários, transporte escolar, recursos humanos e outros materiais adaptados às necessidades desses estudantes. 

 

§ 6º A SEE assegurará aos estudantes que apresentem necessidades diferenciadas de comunicação, o acesso aos conteúdos por meio da utilização de linguagens e códigos aplicáveis, como o sistema Braille e a Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS, sem prejuízo do aprendizado da língua portuguesa e da língua indígena.

 

§ 7º A SEE promoverá a articulação das diretrizes pedagógicas e administrativas sobre o atendimento educacional especializado no âmbito da educação escolar indígena, conforme a Resolução CEE/AC nº 277/2017 e Instrução Normativa SEE/AC 001/2018, respeitando-se as especificidades culturais indígenas.

 

Seção V

Da Educação de Jovens e Adultos

 

Art. 21. A modalidade de Educação de Jovens e Adultos - EJA nas aldeias deverá respeitar os fundamentos da interculturalidade, do bilinguismo e das diferenças culturais e ter proposta pedagógica articulada às efetivas necessidades de alfabetização dos jovens e adultos indígenas.

 

§ 1º A oferta da EJA em comunidades indígenas deverá consolidar metodologias interculturais de alfabetização de jovens e adultos;

 

§ 2º A SEE deverá publicar sistematicamente materiais didáticos adequados à escolarização de jovens e adultos indígenas;

 

§ 3º A SEE estruturará ação específica para a oferta da EJA em aldeias indígenas, considerando as etapas de alfabetização, de ensino fundamental e do ensino médio.

 

§ 4º A oferta da EJA não deve substituir a oferta regular da educação básica na educação escolar indígena.

 

Art. 22. Todas as vezes em que se fizer necessário, seja por demanda das comunidades indígenas ou para efetiva concomitância da formação do professor indígena, a SEE promoverá exames especiais para docentes indígenas na EJA.

 

Seção VI

Da Educação Profissional e Tecnológica

 

Art. 23. Esta modalidade de ensino, presente na etapa do ensino médio, deverá articular os princípios da formação ampla, a sustentabilidade socioambiental e o respeito à diversidade dos povos indígenas, considerando suas formas de organização e suas diferenças sociais, políticas, econômicas, culturais e os direitos indígenas, devendo:

I - ocorrer através das escolas indígenas que ofertam ensino médio, podendo envolver outras instituições públicas ou privadas, através de parcerias; e

II - constituir um conjunto de cursos profissionalizantes interculturais a serem ofertados aos povos indígenas, que:

a) contribuam para a construção da gestão territorial autônoma, possibilitando a reflexão e elaboração de projetos de desenvolvimento sustentável e de produção alternativa, de segurança alimentar, de saúde e no atendimento às mais diversas necessidades cotidianas;

b) articulem-se aos projetos comunitários, definidos a partir das demandas coletivas das comunidades e povos indígenas; e

c) proporcionem aos estudantes indígenas oportunidades de atuação em diferentes áreas do trabalho técnico, necessárias ao desenvolvimento de suas comunidades, como as da tecnologia da informação, saúde, gestão territorial e ambiental.

 

 

CAPÍTULO VII

Dos Projetos Político Pedagógicos Interculturais e Específicos

 

Seção I

Da Concepção e Elaboração

 

Art. 24 O PPP expressa a autonomia e a identidade das unidades escolares indígenas, sendo referência educacional, representa a garantia ao direito da educação escolar diferenciada, específica, bilíngue ou multilíngue, devendo apresentar os princípios e objetivos da educação escolar indígena de acordo com as diretrizes curriculares instituídas nacional e local e, em especial, os projetos de sociedade de cada povo e comunidade indígena.

 

Parágrafo único. (VETADO)

I – (VETADO)

II - (VETADO); 

III - (VETADO);

IV - (VETADO);

V - (VETADO);

VI - (VETADO);

VII - (VETADO)

VIII - (VETADO)

IX – (VETADO); e

X - (VETADO);

 

Seção II

Do Reconhecimento e do Acolhimento dos Projetos Político Pedagógicos

 

Art. 25. Os projetos político pedagógicos deverão: 

I - relacionar-se com os desafios contemporâneos enfrentados pelos povos indígenas para fortalecer a autonomia e o protagonismo quanto a sustentabilidade ambiental e territorial, a identidade, aos direitos indígenas e aos patrimônios culturais e linguísticos, assim como os projetos de educação de cada comunidade e povo indígena;

II - estar alicerçados nos princípios da interculturalidade, bilinguismo e multilinguismo, especificidades, organização comunitária e territorialidade;

III - ser construído de forma autônoma e coletiva, valorizando os saberes, a oralidade e a história de cada povo em diálogo com os demais saberes produzidos por outras sociedades;

IV - ser organizado de diferentes e complementares formas, tais como: ciclos; seriação; módulos; etapas em regimes de alternância; tempo integral ou outra forma de organização que melhor atenda às especificidades de cada contexto escolar e comunidade indígena; e

V - Possibilitar que a escola contribua para a continuidade sociocultural dos povos indígenas em seus territórios, em benefício do desenvolvimento de estratégias que viabilizem respostas educacionais aos desafios contemporâneos;

 

Art. 26. A elaboração do PPP caberá aos professores indígenas em articulação com toda a comunidade educativa, contando com assessoria da SEE, das organizações indígenas e órgãos indigenistas do Estado e da sociedade civil de apoio às populações indígenas e ser objeto de consulta livre, prévia e informada, para sua aprovação comunitária e reconhecimento junto a SEE e CEE.

 

§ 1º A SEE poderá firmar parcerias com as organizações indígenas, Fundação Nacional do Índio - FUNAI, instituições de educação superior, bem como outras organizações governamentais e não governamentais, criar e implementar programas de assessoria especializada em educação escolar Indígena objetivando dar suporte para o funcionamento das escolas indígenas na execução do seu projeto político-pedagógico.

 

§ 2º As escolas indígenas promoverão adequações pedagógicas e administrativas todas as vezes que assim se fizer necessário em face da plena execução dos PPP’s.

 

§ 3º A SEE apoiará a plena execução dos PPP’s das unidades escolares indígenas.

 

CAPÍTULO VIII

Dos Currículos na Educação Escolar Indígena

 

Seção I

Da Concepção e Elaboração

 

Art. 27. O currículo está ligado às concepções e práticas que definem o papel sociocultural da escola, tratando:

I - dos modos de organização;

II - dos tempos e espaços da escola;

III - de suas atividades pedagógicas; 

IV- das relações sociais construídas no cotidiano comunitário;

V - das interações do ambiente educacional com as próprias comunidades educativas;

VI - das relações de poder presentes no fazer educativo; e 

VII - das formas de conceber e construir conhecimentos escolares e não escolares de ensino e aprendizagem sendo parte importante dos processos sociopolíticos e culturais de construção das identidades indígenas.

 

§ 1º A SEE criará, de acordo com os fundamentos pedagógicos da educação escolar indígena, referenciais curriculares interculturais para a oferta da educação básica no âmbito da educação escolar Indígena em todas as suas modalidades e etapas.

 

§ 2º Os currículos interculturais deverão ser construídos a partir dos valores e interesses etnopolíticos das comunidades indígenas em relação aos seus projetos de sociedade e de escola, definidos nos PPP’s, em articulação com a Base Nacional Comum Curricular - BNCC.

 

§ 3º Os currículos serão dinâmicos, flexíveis e diretamente relacionados aos contextos socioculturais das comunidades indígenas em seus projetos de educação escolar.

 

§ 4º Para a construção dos currículos serão consideradas as condições de escolarização dos estudantes indígenas e docentes em cada etapa e modalidade de ensino, bem como os seguintes aspectos:

I - os diversos contextos e espaços de ensino e aprendizagem;

II - a mudança de perfil dos alunos entre as diferentes etapas da educação básica, a efetiva participação comunitária, as competências e os direitos de aprendizagem dos alunos e as especificidades culturais, linguísticas e territoriais dos povos indígenas;

III - a organização pedagógica por formas diversas, tais como: por eixos temáticos; projetos de pesquisa; eixos geradores ou matrizes conceituais, em que se efetuarão os conteúdos das diversas disciplinas e áreas de conhecimento; e

IV - a pesquisa intercultural para a produção do material didático como base para o seu desenvolvimento, tanto no que se refere à formação dos profissionais da educação escolar indígena, como dos alunos, sejam escritos na língua portuguesa, nas línguas indígenas ou bilíngues, por refletir a perspectiva intercultural da educação diferenciada, sendo a SEE responsável pela sua publicação sistemática.

 

Seção II

Do reconhecimento e Acolhimento pelo Sistema de Ensino dos Currículos

 

Art. 28. Aos currículos escolares são garantidos:

I - a flexibilidade na organização dos tempos e espaços curriculares, tanto no que se refere à BNCC, quanto à parte diversificada, de modo a incluir os saberes e procedimentos culturais produzidos pelas comunidades indígenas, tais como: línguas indígenas, crenças, memórias, identidade étnica, organizações sociais, relações humanas, manifestações artísticas e práticas desportivas;

II - a relação direta entre a estruturação física das escolas indígenas e os projetos educacionais de cada povo e ou comunidade indígena nas diferentes etapas e modalidades da educação básica;

III - a articulação dos diferentes campos de conhecimento de forma contextualizada, interdisciplinar, transdisciplinar, intercultural e específica, fomentando o estudo e a pesquisa de temas da realidade das comunidades e povos indígenas;

IV - a consolidação de metodologias didáticas e pedagógicas adequadas às características das diferentes comunidades e povos indígenas, bem como aos processos próprios de aprendizagem e projetos educacionais de cada povo e ou comunidade indígena;

V - o cuidado e o respeito aos alunos em suas diferentes faixas etárias e gênero, desde a infância à fase adulta;

VI - em caso de oferta de educação especial o currículo deverá oferecer formação complementar ou suplementar à formação dos estudantes indígenas que apresentem tal necessidade;

VII - a criação de condições para a construção e o desenvolvimento dos currículos das escolas indígenas com a participação das respectivas comunidades educativas; e

VIII - a promoção da gestão comunitária, democrática, diferenciada e intercultural da Educação Escolar Indígena, bem como a formação inicial e continuada dos professores indígenas docentes e gestores que privilegie a discussão a respeito das propostas curriculares das escolas indígenas em atenção aos interesses e especificidades de suas respectivas comunidades e povos.

 

CAPÍTULO IX

Das Avaliações

 

Seção I

No Sistema de Ensino

 

Art. 29. A SEE elaborará um sistema de avaliação intercultural para oferta regular da educação básica no âmbito da educação escolar indígena, a partir de:

I - indicadores etnoeducacionais;

II - os contextos socioculturais e linguísticos dos alunos indígenas;

III - os processos próprios de aprendizagem;

IV - oferta de vagas, rendimento dos alunos e evasão escolar;

V - alimentação escolar; e

VI - Insumos, estrutura física e didático-pedagógica para o atendimento à educação escolar indígena.

 

Parágrafo único. O sistema de avaliação intercultural considerará, ainda, modelos, procedimentos e índices de avaliação da qualidade da educação básica dirigida às escolas não indígenas.

 

 

Seção II

Nas Unidades Escolares Indígenas

 

Art. 30. A avaliação, um dos elementos que compõe o processo de ensino e aprendizagem, configura-se como estratégia didática, cujos fundamentos e procedimentos se definem nos PPP’s de cada escola indígena e se articula ao planejamento e gestão das unidades escolares, bem como à formação inicial e continuada dos docentes e demais profissionais da educação, ao regimento escolar e, por fim, à oferta da educação escolar indígena. 

 

§ 1º A avaliação deverá associar-se aos processos de ensino e aprendizagem próprios, possibilitando a participação e o protagonismo indígena, cujos procedimentos devem ser elaborados em cada escola indígena e acolhidos pelo sistema de ensino público.

 

§ 2º A avaliação terá como base aspectos qualitativos, quantitativos, diagnósticos, processuais, formativos, dialógicos e participativos, considerando-se as capacidades em cada etapa e segmento, os direitos de aprender, as experiências de vida dos alunos, as características culturais, as línguas, os valores sociais, as dimensões cognitiva, afetiva, emocional, lúdica e de desenvolvimento físico e motor.

 

§ 3º A avaliação deve promover práticas que possibilitem a reflexão de suas ações pedagógicas no sentido de reorientá-las para o aprimoramento dos seus projetos educativos, da relação com a comunidade, da relação entre docentes e discentes, assim como da gestão e participação comunitária na tomada de decisões sobre a escola.

 

CAPÍTULO X

Seção I

Da Profissionalização, da Valorização e da Carreira no Magistério Público Estadual Indígena

 

Art. 31. A formação dos docentes para atuar na educação básica, no âmbito da educação escolar indígena far-se-á, valendo-se do regime de colaboração, em nível superior, em cursos presenciais de licenciatura, preferencialmente interculturais, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade normal, preferencialmente em cursos interculturais de magistério.

 

Parágrafo único. A formação continuada poderá ocorrer através de programas especiais de formação pedagógica e aproveitamento de estudos ou, ainda, em outros cursos destinados ao magistério indígena. 

 

Art. 32. São objetivos dos cursos destinados à formação de professores indígenas: 

I - formar, em nível da educação superior e do ensino médio, docentes e gestores indígenas para atuar na educação escolar indígena com vistas ao exercício integrado da docência, da gestão e da pesquisa assumida como princípio pedagógico;

II - a formação docente, respeitadas as etapas inicial e continuada, bem como os níveis de escolarização médio e superior, poderão ser propostas pelos próprios povos indígenas, respeitando-se os fundamentos da educação escolar indígena, cabendo às instituições formadoras a criação de mecanismos técnicos-administrativos e pedagógicos para articulação aos sistemas de ensino;

III - fundamentar e subsidiar a construção de currículos, metodologias, processos de avaliação e de gestão de acordo com os interesses de escolarização dos diferentes povos e comunidades indígenas;

IV - desenvolver estratégias que visem à construção dos projetos políticos e pedagógicos das escolas indígenas com desenhos curriculares e percursos formativos diferenciados e que atendam às suas especificidades étnicas, culturais e linguísticas; 

V - fomentar pesquisas voltadas para as questões do cotidiano escolar, para os interesses e as necessidades culturais, sociais, étnicas, políticas, econômicas, ambientais e linguísticas dos povos indígenas e de suas comunidades, articuladamente aos projetos educativos dos povos indígenas; 

VI - promover a elaboração de materiais didáticos e pedagógicos bilíngues e monolíngues, conforme a situação sociolinguística e as especificidades das etapas e modalidades da educação escolar indígena requeridas nas circunstâncias específicas de cada povo e comunidade indígena; e 

VII - promover a articulação entre os diferentes níveis, etapas, modalidades e formas da educação escolar indígena, desenvolvendo programas integrados de ensino e pesquisa, de modo orgânico, em conformidade com os princípios da educação escolar específica, diferenciada, intercultural e bilíngue.

 

Art. 33. A profissionalização do exercício do magistério público indígena deverá ocorrer como compromisso público da política de educação do Acre.

 

§ 1º Por profissionalização compreende-se o conjunto de ações formativas estruturadas a partir dos fundamentos da educação escolar indígena, em consonância com o sistema estadual de ensino, garantindo aos povos indígenas o pleno exercício pedagógico, técnico-administrativo e de gestão educacional. 

 

§ 2º A profissionalização se dará pela efetiva formação e habilitação do docente indígena, nas etapas inicial e continuada, bem como pela formação de gestores educacionais indígenas, com vistas ao pleno exercício educacional.

 

§ 3º A SEE, enquanto persistir a demanda de formação docente para o atendimento à educação básica nas unidades escolares indígenas, inclusive valendo-se do regime de colaboração, promoverá a formação em magistério intercultural, a formação inicial, a continuada e a capacitação intercultural dos profissionais no âmbito da educação escolar indígena.

 

Art. 34. A SEE garantirá a profissionalização, reconhecimento e desenvolvimento do magistério público estadual indígena.

 

Art. 35. Por valorização profissional, compreende-se o conjunto de ações implementadas pela SEE objetivando:

I - a formação e o aperfeiçoamento do profissional da educação escolar indígena; 

II - garantia de ingresso na carreira por concurso público com condições específicas e interculturais;

III - a isonomia de vencimentos, prêmios, vantagens, gratificações, promoção e progressão na carreira, sem quaisquer disparidades funcionais ou de cargo, conforme Lei Complementar nº 67, de 29 de junho de 1999 e alterações posteriores;

IV - o equitativo tratamento e geração de oportunidades para o pleno exercício pedagógico intercultural, sem obstáculos ou discriminação de qualquer ordem;

V - as condições de trabalho condignas e salubres; e

VI - a compatibilidade com suas aspirações educacionais e estilos de vida.

 

Art. 36. A SEE promoverá o ingresso de profissionais no magistério público indígena, por meio de concursos públicos destinados aos povos e comunidades indígenas, com vistas à efetiva regularização da oferta da educação básica nas aldeias, plena articulação das unidades escolares indígenas de forma orgânica no sistema educacional estadual, criando o quadro efetivo de profissionais do magistério público indígena.

I - os concursos públicos ocorrerão segundo critérios interculturais, bilíngues ou multilíngues, atendendo às especificidades culturais dos povos indígenas; e

II - será garantida pela SEE a consulta livre, prévia e informada à Organização dos Professores Indígenas do Acre - OPIAC e sua efetiva participação na construção dos critérios de avaliação do concurso, sendo ainda, ouvida a (FUNAI).

 

Seção II

                           Atribuições e Características da Formação Intercultural

 

Art. 37. A SEE deverá garantir o acesso, a permanência e a conclusão com êxito, por meio da elaboração de planos estratégicos diferenciados, para que os professores indígenas tenham uma formação com a exigida qualidade sociocultural, tanto no nível médio, quanto na educação superior, valendo-se na forma da lei, do regime de colaboração.

I - a formação terá caráter intercultural, diferenciado, bilíngue ou multilíngue e, quando for o caso, sempre que possível, específica a cada povo indígena;

II - no âmbito do curso de magistério, a formação intercultural, terá duas etapas, a inicial, para os docentes cujo grau de escolaridade é o ensino fundamental completo e, continuada, para os docentes cujo grau de escolaridade é o ensino médio completo; 

III - os processos de formação para as equipes gestoras das unidades escolares indígenas serão contínuos e priorizarão as seguintes temáticas:

a) gestão de pessoas, processos e recursos financeiros;

b) legislação educacional; 

c) instrumentos de comunicação e expressão escrita; 

d) desenvolvimento integral do aluno; 

e) construção e implementação do currículo, seus parâmetros, diretrizes e orientações; 

f) instrumentos de avaliação da escola e da gestão; 

g) elaboração de plano de trabalho de gestão escolar; e

h) noções de licitação e pregão.

IV - A SEE deverá instituir processos contínuos de formação dirigida aos servidores da SEE cuja atuação incida direta ou indiretamente ao atendimento das escolas indígenas.

 

Art. 38. A formação intercultural destinada aos docentes indígenas ocorrerá considerando as etapas e modalidades ofertadas nas unidades escolares, desde a educação infantil, o ensino fundamental, o ensino médio, o ensino médio profissionalizante, a EJA e a educação especial.

 

§ 1º A formação para a educação infantil deverá considerar as práticas de educar e de cuidar de cada comunidade e povo indígena como fundamentos pedagógicos da educação escolar das crianças, considerando ainda seus espaços e tempos socioculturais.

 

§ 2º A formação na educação infantil terá como base a elaboração de materiais didáticos específicos e interculturais, construídos em contexto aldeão para o efetivo apoio e reflexão pedagógica ao docente nesta modalidade de ensino.

 

§ 3º A formação docente para o segmento do ensino fundamental deverá proporcionar o amplo acesso aos conhecimentos científicos não indígenas e indígenas, articulando práticas pedagógicas e culturais próprias aos povos indígenas, de forma a constituir processos interculturais de aprendizagem, consolidando inovações pedagógicas geradas nas aldeias, considerando:

I - o fomento às reflexões pedagógicas associadas ao bem viver de suas comunidades e povos; e

II - a especial atenção aos diferentes momentos da vida dos estudantes: infâncias, juventudes e fase adulta.

 

§ 4º A formação para os professores que atuam no ensino médio deverá levar em consideração procedimentos pedagógicos que fortaleçam a autonomia e o protagonismo dos povos indígenas no enfrentamento dos desafios contemporâneos quanto à sustentabilidade ambiental e territorial, à identidade, aos direitos indígenas e aos patrimônios culturais e linguísticos, garantindo-se:

I - a interlocução dos conhecimentos científicos não indígenas aos conhecimentos científicos indígenas e suas práticas culturais próprias, possibilitando inovações pedagógicas nesta etapa da educação básica;

II - a adequação à modalidade escolhida pela comunidade educativa, cabendo ao sistema de ensino a atualização de propostas e procedimentos pedagógicos formativos;

III - o atendimento às necessidades dos povos indígenas no que se refere à criação de políticas linguísticas comunitárias.

 

§ 5º O docente para atuar na educação especial em unidades escolares indígenas deve possuir conhecimentos na área da educação especial através de formação inicial e continuada e especialização, a fim de proporcionar metodologias para o acesso aos conteúdos desenvolvidos nos PPP’s das respectivas escolas, garantindo-se:

I - a utilização de linguagens e códigos aplicáveis, como o sistema Braille e a LIBRAS, sem prejuízo do aprendizado da língua portuguesa e da língua indígena e, concomitantemente, estimular a criação de sistemas linguísticos interculturais;

II - o assessoramento técnico especializado e o apoio da equipe responsável pela educação especial em parceria com as instâncias administrativas e pedagógicas da educação escolar indígena.

 

§ 6º A formação inicial e continuada para o docente que atua na EJA favorecerá reflexões pedagógicas que possibilitem aos alunos dessa modalidade de ensino atuarem nas atividades socioeconômicas e culturais de suas comunidades com vistas à construção do protagonismo indígena e da sustentabilidade de seus territórios.

 

§ 7º A formação inicial e continuada do docente para atuar no ensino médio/educação profissional deverá contribuir para a construção da gestão territorial autônoma, a elaboração de projetos de desenvolvimento sustentável e de produção alternativa para as comunidades indígenas.

 

§ 8º A formação inicial e continuada docente contará com a participação dos sábios, dos mais velhos e, demais lideranças indígenas que poderão atuar como formadores, cabendo às instituições formadoras a adoção de estratégias específicas identificadas para este fim.

 

CAPÍTULO XI

Da Comissão de Educação Escolar Indígena e da Política Pública de Educação Indígena

 

Art. 39. Será criada a comissão de educação escolar indígena, paritária, nomeada pelo secretário de educação como instância democrática, permanente, consultiva e deliberativa acerca da elaboração da política pública de educação escolar indígena. 

 

§ 1º Serão convidados a participar da comissão: a sociedade civil organizada de apoio aos povos indígenas, representantes e organizações dos povos indígenas, o MEC, instituições de ensino superior, o CEE, a assessoria de assuntos indígenas, a FUNAI, a SEE, Secretarias Municipais de Educação, a UNDIME e o Ministério Público Federal - MPF.

 

§ 2º Caberá a comissão a elaboração do seu estatuto que disciplinará as suas atribuições e competências.

 

CAPÍTULO XII

Seção I

Da Alimentação Escolar e Interculturalidade

 

Art. 40. Alimentação escolar será todo alimento oferecido no ambiente escolar, durante o período letivo, tendo como princípios o direito ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades educacionais, tendo como base, práticas e alimentos promotores da saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, econômica e socialmente sustentáveis.

 

§ 1º Será criado um programa estadual de regionalização da merenda oferecida em escolas indígenas, priorizando-se a aquisição de gêneros alimentícios de origem vegetal e animal das próprias comunidades e povos indígenas, por meio, de suas associações, cooperativas, organizações indígenas ou fornecedores individuais.

 

§ 2º Serão elaborados etnocardápios, considerando os hábitos alimentícios e disponibilidade agrícola nos territórios indígenas, sendo que:

I - os cardápios da alimentação escolar serão elaborados por nutricionista responsável com utilização de gêneros alimentícios básicos, respeitando-se as referências nutricionais, os hábitos alimentícios, a cultura e a tradição alimentar de cada povo e terra indígena, pautando-se na sustentabilidade e na diversificação agrícola do local, na alimentação saudável e adequada; e

II - os etnocardápios deverão ser submetidos às representações dos diferentes povos indígenas.

 

Art. 41. A aquisição dos gêneros alimentícios oferecidos como merenda escolar obedecerá ao cardápio planejado pelo nutricionista e comunidades indígenas e será realizada, sempre que possível, no mesmo município em que se localizam as escolas.

I - a distribuição da merenda escolar deverá ser regular, adquirida e distribuída em proporção e períodos adequados ao funcionamento da escola;

II - a aquisição e distribuição deverá atender aos alunos matriculados no ano anterior, conforme o censo escolar e, quando for o caso de incremento na matrícula, deverá ser complementada pela SEE; e

III - a gestão dos itens alimentícios que compõe o cardápio da merenda escolar, após a entrega, será de responsabilidade da unidade escolar e comunidade indígena, sendo vedada sua utilização em contextos não escolares.

 

Seção II

Da Aquisição de Merenda Junto a Produtores Indígenas

 

Art. 42. Do total dos recursos financeiros repassados pelo FNDE, destinados à alimentação escolar, e recursos próprios, no mínimo trinta por cento de cada fonte, deverão ser utilizados, quando possível, na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar indígena, priorizando suas respectivas comunidades, sempre que as mesmas apresentarem disponibilidade agrícola para tal.

 

CAPÍTULO XIII

Da Estrutura Física, dos Equipamentos, do Mobiliário e dos Insumos

 

Art. 43. A estruturação física de uma unidade escolar indígena deverá ser compreendida como o conjunto de medidas que vise prover as escolas de prédio próprio, dos diversos materiais, equipamentos, mobiliários e demais insumos, tanto de natureza pedagógica, como administrativa e de apoio considerados necessários e indispensáveis ao funcionamento e à qualidade do processo de ensino e aprendizagem, às etapas e modalidades ofertadas.

 

§ 1º A criação de escolas indígenas atenderá reivindicação da comunidade indígena ou por iniciativa da SEE, com a devida anuência comunitária, respeitadas as formas indígenas de representação e os critérios técnicos a serem definidos em instrução normativa.

 

§ 2º São considerados equipamentos, mobiliários e insumos prioritários para o bom funcionamento da unidade de ensino:

I - equipamentos para cozinha e refeitórios escolares;

II - material escolar;

III - biblioteca e acervo;

IV - mobiliário para composição das salas de recursos multifuncionais;

V - mobiliário para educação infantil;

VI - materiais didáticos pedagógicos e equipamentos para tecnologia assistiva;

VII - instrumentos musicais e eletrônicos;

VIII - computador interativo e lousa digital;

IX - laboratório de informática;

X - laboratório de ciências; e

XI - notebooks e impressora multifuncional.

 

Art. 44.  A estrutura física do prédio escolar deverá refletir, sempre que possível, a arquitetura tradicional das comunidades indígenas.

 

§ 1º As necessidades arquitetônicas das escolas deverão refletir as identidades culturais de cada povo indígena, reproduzir contextos tradicionais de aprendizagem e organização social e suas formas de transmissão de conhecimentos, reafirmando as identidades indígenas;

 

§ 2º A SEE deverá estruturar as unidades escolares, visando o pleno atendimento das necessidades educacionais indígenas, devendo:

I - considerar uma diversidade de ambientes escolares, oferecendo aos alunos diversas situações e possibilidades de salas distintas, cada uma delas apropriadas a determinadas finalidades educacionais;

II - acompanhar e fiscalizar, juntamente com as comunidades educativas, representadas por suas lideranças e FUNAI, a execução das obras, garantindo-se o respeito aos padrões técnicos aprovados para cada uma das construções; e

III - criar, no prazo máximo de dois anos, a partir da aprovação desta lei, protocolo para construção de novas unidades escolares em conformidade com as demandas comunitárias (chamada escolar) e legislação concernente à temática da educação escolar indígena, garantindo às comunidades educativas a consulta livre prévia e informada referente aos padrões arquitetônicos e necessidades pedagógicas, em correlação com as etapas e modalidades da educação básica, atendidas pela unidade escolar e número de alunos atendidos.

 

CAPÍTULO XIV

Disposições Finais

 

Art. 45. A SEE, no prazo máximo de dois anos, a partir da publicação desta Lei consolidará todas as normativas correlatas, documentos técnicos e orientadores dos procedimentos pedagógicos e de gestão das unidades escolares indígenas, bem como as adequações administrativas necessárias à plena articulação das escolas indígenas ao sistema de ensino, em sintonia com os fundamentos da educação escolar indígena, devendo:

I - promover o fortalecimento institucional da coordenação de educação escolar indígena no âmbito da SEE;

II - promover adequações administrativas na estrutura organizacional da SEE para o melhor e mais eficaz atendimento à educação escolar indígena;

III - desenvolver programa de formação para os profissionais da educação escolar indígena;

IV - regulamentar administrativamente as escolas indígenas, articulando-as como unidades próprias, autônomas e específicas no sistema estadual de ensino;

V - criar um sistema estadual intercultural de avaliação de qualidade educacional, interligando o conjunto das unidades escolares indígenas; e

VI - ofertar a educação escolar indígena, diretamente ou por meio de regime de colaboração com municípios, cujas redes educacionais atendam aos povos indígenas.

 

Parágrafo único. A SEE garantirá a plena e regular oferta da educação básica na educação escolar indígena, observando-se que:

I - a plena e regular oferta configura-se pela adequada formação docente e de gestão escolar, consolidação dos projetos político pedagógicos e currículos específicos, pela adequada e condigna infraestrutura dos prédios escolares, bem como os insumos ao trabalho docente e administrativo da unidade escolar, pela merenda escolar sustentável e saudável e, por fim, pelo o ingresso na carreira do magistério via concurso público específico;

II - o zelo pela profissionalização e manutenção pública do magistério indígena;

III - a elaboração e publicação sistemática de material didático, específico e diferenciado, para uso nas escolas indígenas;

IV - a participação social indígena realizada, em especial, através da comissão de educação escolar indígena; e

V - o pleno respeito às culturas, aos modos de vida, às variadas formas de organização social, ao meio ambiente e ao território indígena.

 

Art. 46. A SEE deverá garantir o suporte técnico e financeiro específico e adequado para o pleno atendimento da educação escolar indígena em suas dimensões formativa, de gestão, administrativa e estrutural.

 

Art. 47. Os casos omissos nesta lei deverão ser tratados pela comissão de educação escolar indígena resguardando-se os princípios da equidade, da justiça social, do compromisso ético e político com as populações indígenas, os fundamentos da educação escolar indígena, pautada pela especificidade, pela interculturalidade, pelas diferenças culturais, pelas formas de organização social dos povos indígenas, assim como, pela legislação nacional vigente em relação aos povos indígenas, preservada a autonomia do sistema de ensino estadual.

 

Art. 48 Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

 

Rio Branco-Acre, 27 de dezembro de 2018, 130º da República, 116º do Tratado de Petrópolis e 57º do Estado do Acre.

 

Tião Viana

Governador do Estado do Acre

 

 

Este texto não substitui o publicado no DOE de 28/12/2018.

 

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