LEI Nº 4.065, DE 15 DE DEZEMBRO DE 2022
Dispõe sobre a criação da Política Estadual de Proteção e Atenção Integral aos Órfãos e Órfãs de Feminicídio. |
O GOVERNADOR DO ESTADO DO ACRE
FAÇO SABER que a Assembleia Legislativa do Estado do Acre decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Fica instituída, no Estado, a Política Estadual de Proteção e Atenção Integral aos Órfãos e Órfãs de Feminicídio, voltado para a proteção e promoção de atenção multisetorial de crianças e adolescentes até 18 anos de idade, cujas mães ou responsáveis legais tenham sido vítimas de feminicídio.
Art. 2º Para garantir a eficácia da Política Estadual de Proteção e Atenção Integral aos Órfãos e Órfãs de Feminicídio, o Poder Executivo elaborará anualmente, o Plano Estadual de Proteção e Atenção Integral aos Órfãos e Órfãs de Feminicídio, o qual será executado nos termos da presente lei e monitorado pelos órgãos oficiais de controle externo e por organizações da sociedade civil organizada.
Art. 3º Para fins desta lei, órfão e órfã de feminicídio, são crianças e adolescentes dependentes de mulheres assassinadas em contexto de violência doméstica e familiar ou de flagrante menosprezo e discriminação à condição de mulher, caracterizando-se como crime de feminicídio nos termos em que dispõem a Lei Federal nº 13.104, de 9 de março de 2015, e a Lei Federal nº 11.340, de 7 de agosto de 2006.
§ 1º As mulheres vítimas de feminicídio referidas no caput são todas aquelas que se autoidentificam com o gênero feminino, vedadas discriminações por raça, orientação sexual, deficiência, idade, escolaridade e de outras naturezas.
§ 2º A execução da Política Estadual de Proteção e Atenção Integral aos Órfãos e Órfãs de Feminicídio, será orientada pela garantia da proteção integral e prioritária dos direitos das crianças e dos adolescentes, preconizada pela Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990.
§ 3º A Política Estadual de Proteção e Atenção Integral aos Órfãos e Órfãs de Feminicídio compreende a promoção de direitos à assistência social, à saúde, à alimentação, à moradia, à educação, à assistência jurídica gratuita para órfãos e órfãs do feminicídio, compreendendo-os (as) também como vítimas colaterais da violência de gênero.
§ 4º Integra a Política Estadual de Proteção e Atenção Integral aos Órfãos e Órfãs de Feminicídio, a concessão de auxílio-financeiro no valor de um salário-mínimo, por filho com idade de 0 a 18 anos, em caso de feminicídio consumado, quando comprovadamente em situação de pobreza, independentemente de outros auxílios financeiros de políticas públicas de combate à fome e a pobreza que porventura a família receba.
Art. 4º Os recursos destinados ao custeio do pagamento do auxílio financeiro aos órfãos e órfãs de feminicídio, serão oriundos do Fundo Estadual de Reparação às Vítimas de Crimes – FERVS.
Art. 5º São princípios da Política Estadual de Proteção e Atenção Integral aos Órfãos e Órfãs de Feminicídio:
I – acolhimento e proteção integral como dever norteador das políticas e serviços públicos;
II - atendimento especializado e por equipe multidisciplinar dos órfãs e órfãs de feminicídio, com prioridade absoluta, considerada a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento;
III - fortalecimento do sistema de garantia dos direitos da criança e do adolescente, do Sistema Único de Saúde - SUS e do Sistema Único de Assistência Social - SUAS, em seus componentes especializados no atendimento a vítimas de violência, como equipamentos públicos prioritários no atendimento a órfãos e órfãs do feminicídio e responsáveis legais;
IV – reprodução social digna de crianças em situação de pobreza;
V - vedação às condutas de violência institucional, praticadas por instituição pública ou conveniada, para não gerar revitimização dos órfãs e órfãs de feminicídio, nos termos do art. 4º, inciso IV, da Lei Federal nº 13.431, de 4 de abril de 2017.
Art. 6º A Política Estadual de Proteção e Atenção Integral aos Órfãos e Órfãs de Feminicídio tem como objetivo assegurar a proteção integral e a dignidade da pessoa humana para o desenvolvimento das crianças e dos adolescentes de viverem dignamente e sem violência, preservando sua saúde física e mental, seu pleno crescimento alicerçados na garantia de seus direitos específicos na condição de vítimas ou testemunhas de violência, no âmbito de relações domésticas, familiares e sociais, resguardando-os de toda forma de negligência, discriminação, abuso e opressão, na forma que dispõe o art. 2º da Lei Federal nº 13.431, de 2017.
Art. 7º São diretrizes da Política Estadual de Proteção e Atenção Integral aos Órfãos e Órfãs de Feminicídio:
I - o atendimento de órfãos e órfãs do feminicídio e responsáveis legais, por unidades de referência do Sistema Único de Assistência Social - SUAS, preferencialmente por Centros de Referência Especializado de Assistência Social - CREAS, para concessão de benefícios socioassistenciais de provimento alimentar direto em caráter emergencial e auxílio em razão do desabrigo temporário, bem como orientação para preenchimento de formulários para acesso a auxílio-financeiro especificamente destinado aos filhos e filhas menores e previdenciários, como auxílio-reclusão e pensão por morte;
II - a observância em decisões de processos judiciais relativos à guarda de órfãos e órfãs de feminicídio, da perda do poder familiar por quem praticou o feminicídio, nos termos do art. 1.638, Parágrafo único, inciso I, alínea “a”, da Lei Federal nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002;
III - a priorização dos órfãos e órfãs de feminicídio em programas, projetos e ações sociais no âmbito do Estado;
IV - quando houver necessidade, a inserção do órfão e órfã de feminicídio e seus familiares ou responsáveis legais em programas de proteção policial do Estado do Acre;
V - a implementação de políticas de acompanhamento aos órfãos e órfãs de feminicídio, com atenção especial para as consequências físicas e psicológicas;
VI - a realização de escuta especializada de crianças e adolescentes dependentes de mulheres em situação de violência doméstica e familiar, quando necessário, visando minimizar a revitimização decorrente de escuta não qualificada e dar celeridade às medidas protetivas, nos termos da Lei Federal nº 13.431, de 2017;
VII - o incentivo à realização de estudos de caso pela rede de atenção para vítimas e familiares em contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher ou de feminicídio tentado, para atuar na prevenção da reincidência e da letalidade da violência de gênero, bem como para garantir a intersetorialidade na proteção integral dos direitos de crianças e adolescentes;
VIII - a integração operacional de órgãos do Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Conselho Tutelar e encarregados da execução das políticas sociais básicas e de assistência social, para o efetivo atendimento multissetorial de crianças e adolescentes filhos de vítimas de feminicídio;
IX - a obrigatoriedade de comunicação ao Conselho Tutelar e ao Ministério Público, pela delegada ou pelo delegado de Polícia competente, do nome completo de crianças e adolescentes dependentes de vítimas de feminicídio e suas respectivas idades, devidamente identificados ao se lavrarem ocorrências de violência doméstica e familiar contra a mulher, consoante o art. 12, § 1º, inciso II, da Lei Federal nº 11.340, de 2006, para que o órgão atue como articulador dos serviços de proteção;
X - o atendimento humanizado em qualquer órgão público que oferece serviços de proteção e pelo conselho tutelar, de crianças e adolescentes órfãos de feminicídio, para encaminhamento de denúncias de violações de direitos ao Ministério Público do Estado do Acre – MPE-AC, aplicando-se as medidas protetivas cabíveis e referenciamento na rede de atendimento, nos termos do art. 136, inciso I, da Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990;
XI - o estabelecimento de estratégias de atendimento médico e de assistência judiciária gratuita, de forma prioritária, à crianças e adolescentes órfãs e órfãs de vítimas de feminicídio;
XII - a garantia do direito à educação dos órfãos e órfãs de feminicídio, mediante a apresentação de documentos comprobatórios da situação de violência, para que seja priorizada a matrícula de dependentes de mulheres vítimas de feminicídio tentados ou consumados, em instituição educacional mais próxima ao domicílio, ou a transferência para a unidade escolar requerida, independentemente da existência de vagas, nos termos do art. 9º, § 7º, da Lei Federal nº 11.340, de 2006;
XIII - a garantia, com prioridade, do atendimento psicossocial e psicoterapêutico especializado e por equipe multidisciplinar dos órfãos e órfãs de feminicídio e seus responsáveis legais, preferencialmente em localidade próxima à sua residência, para o acolhimento e a promoção da saúde mental;
XIV - a capacitação e o acompanhamento de pessoas que ofertarem lar provisório aos órfãos e órfãs de feminicídio, que foram afastados do convívio familiar por medida protetiva determinada judicialmente ou, para adesão voluntária, de membros da família extensa que passarão a ser seus responsáveis legais, para a reconstrução de vínculos familiares e comunitários;
XV – o monitoramento e avaliação da Política Estadual de Proteção e Atenção Integral aos Órfãos e Órfãs de Feminicídio, com expedição anual de relatório, órgão responsável pela coordenação da Política;
XVI - promoção de campanhas permanentes e ações de sensibilização sobre os direitos de familiares de vítimas de feminicídio previstos nesta lei.
Art. 8º Caberá ao Poder Executivo regulamentar a presente lei e todos os aspectos necessários à sua efetiva aplicação.
Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Rio Branco-Acre, 15 de dezembro de 2022, 134º da República, 120º do Tratado de Petrópolis e 61º do Estado do Acre.
Gladson de Lima Cameli
Governador do Estado do Acre
Este texto não substitui o publicado no DOE de 19/12/2022.